Um dos grandes problemas do underground no Brasil é a visão romantizada de muitos artistas e bandas que se recusam a falar sobre negócios. Para muitos, a música é somente arte e a questão monetária é tratada como secundária. Esta é, obviamente, uma visão equivocada e faz com que muitos grupos promissores não consigam explorar suas carreiras da forma correta.
Romantizar o underground e negligenciar a profissionalização do trabalho só vai acarretar prejuízos para a carreira da banda. Quanto mais rápido uma banda entender que ela precisa fazer outras coisas além de tocar bem e gravar suas músicas, mais ela terá chances de se destacar e conseguir realmente viver da sua música.
Em uma recente entrevista ao podcast Plugado, o guitarrista Kiko Loureiro falou sobre os desafios de montar uma banda no Brasil. Questionado sobre qual o maior inimigo do artista pensando na questão dos negócios, ele respondeu o seguinte:
“Acho que a primeira coisa, se bem que hoje é bem menos porque tem mais informação, mas é o cara entender que ele tem que falar de dinheiro e tem que falar de negócio também. Não vai ser assim, ‘sou artista e minha arte não envolve negócio. Eu sou artista e não quero me misturar com isso, alguém que cuide disso’. Eu sempre goste disso, de ver os caras fora com esse conhecimento, e você traz isso pro Brasil e fica meio fora da bolha.
Quando você fala disso aqui, parece que você é o cara que, ‘ah, tá querendo pegar dinheiro, mercenário’. Tem esses termos, né. Mas assim, como que você lida com o empresário do mundo da música? Um cara de gravadora, um cara de uma marca de guitarra, um promotor? Esses caras tão falando de negócios. E a língua que eles falam é de negócios. Então se você não fala essa língua, você não fala com eles e eles não te chamam também.
Quando você começa a falar essa língua, que é a língua do negócio, ‘qual o nosso acordo aqui pros dois ganharem?’, então, quando você fala essa língua, eles querem trabalhar mais com você porque você fala a mesma língua. Eu fui percebendo isso fazendo. E ninguém vai fazer por você também. O Brasil não tem uma estrutura em que, ‘olha, tá cheio de empresário, tá cheio de gente querendo investir’, não tem! Ainda mais nesse estilo que a gente faz (Heavy Metal).”

Kiko prosseguiu comentando sobre a aquela velha história do empresário ser sempre o “malvado”. Sobre isso, ele explicou:
“Quando a economia não gira, aí também aparece uns caras que são paraquedistas, aparece o malandro… que quando deu ruim o negócio, o cara tem que desaparecer. As vezes o cara é malandro e as vezes o cara quebra mesmo. Mas foi esse caminho que eu fui aprendendo e você vai tendo mais contato, a gente teve oportunidade de ir pra outros países e ver como a coisa funcionava no Japão, na Alemanha, na França, aí você vai perguntando. O negócio é você ser curioso.
Você precisa sempre estar do lado de alguém que entende da coisa. Você vai encontrar com seu contador, pergunta pro cara como é que isso funciona, tenta entender pelo menos um pouco. Saber o porquê das coisas, como é que funciona, e estuda, né. Você sabe que isso vai fazer parte da sua carreira.
Estuda as escalas, ensaia com a banda, treina teu instrumento, faz os vocalizes todos, mas você tem que estar com o físico bom também, pra poder aguentar uma turnê. Tem várias outras coisas que você tem que saber. Tem que estar bem com o psicológico, saber lidar com outras pessoas, afinal, você está em um grupo.”
Sobre ser músico no Brasil e enfrentar dificuldades diferentes que os artistas internacionais enfrentam, Kiko disse:
“Tem várias coisas que somam. Por isso, você ser vitorioso saindo do Brasil é uma coisa difícil pra caramba. Muito difícil, e em qualquer área. Os instrumentos aqui são mais caros…
A gente tem o poder da nossa cultura. Se você souber usar esse poder da nossa cultura, como o Sepultura usou, o próprio Angra usou, você acha o seu lugar ao sol ali. ‘Opa, aqui eu posso me posicionar’, só que sempre vai ser mais difícil.
A gente tem um festival grande lá na Europa que é o Wacken, é um dos maiores, se o Wacken te chama pra ir lá tocar, se você é alemão, de carro você tá lá em uma hora, se você tá com uma banda daqui do Brasil com a sua equipe, você já começa comprando 10, 12 passagens internacionais.
Você já sai daqui com uns 15 mil dólares no prejuízo. E o Wacken não vai pagar isso. Você já tem que ser grande pra poder pagar pra banda inteira ir, entendeu? É difícil, tem que ter toda uma engenharia financeira e você tem que entender isso.
Pra eu fazer o Wacken, eu tenho que fazer vários shows. Preciso armar algumas coisas, antes.”
O post Kiko Loureiro desmonta discurso romantizado sobre o underground, “tem que falar de dinheiro e tem que falar de negócio” apareceu primeiro em Mundo Metal.